sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Obras de Andy Warhol

Se há um hábito capaz de unir os diferentes estilos de vida do homem contemporâneo, é o consumo. Talvez essa não seja uma ideia revolucionária hoje. Mas nos anos 60, quando Andy Warhol apareceu no campo das artes reproduzindo em suas pinturas latas de sopa iguais às vendidas nos supermercados, era praticamente impensável elevar um mero produto comercial a símbolo de um valor universal: o poder de compra. Warhol foi o primeiro artista a detectar – e de certa forma orientar – a mudança de valores rumo à sociedade do consumo e do espetáculo. Esse caminho está bem claro na exposição Mr. America, com início marcado para o dia 20 na Estação Pinacoteca em São Paulo. De tanto fabricar, manipular, distorcer e transformar ícones, Warhol tornou-se ele próprio um ícone. Rompeu a fronteira da arte com a vida cotidiana e mudou ambas.
Mr. America é a maior exposição de Andy Warhol (1928-1987) já apresentada no Brasil. Segundo o curador Philip Larratt-Smith, as 169 obras espalhadas pela Estação Pinacoteca, na região central de São Paulo, representam praticamente todos os aspectos do trabalho do artista. “É como uma minirretrospectiva”, diz. A diversidade pulsante de Warhol pode ser vista em 26 pinturas, 58 gravuras, 39 trabalhos fotográficos, duas instalações e 44 filmes. Organizada em colaboração com o The Andy Warhol Museum, em Pittsburgh, nos Estados Unidos, a exposição já foi exibida nas capitais da Colômbia e da Argentina.
Nem sempre é necessário conhecer a vida de um artista para apreciar sua obra. No caso de Andy Warhol, isso é fundamental. Ele vivia sua arte. Não apenas no sentido da dedicação (algo comum a quase todo grande artista), mas na percepção de que seu comportamento e sua imagem eram eles próprios manifestações artísticas. Nesse sentido, também, Warhol antecipou características fundamentais da vida moderna.
Desde o começo da carreira, Warhol entendeu o mercado. Suas experiências com o comércio começaram aos 10 anos, quando acompanhava os dois irmãos mais velhos para vender, de porta em porta, legumes que seus pais cultivavam no quintal de casa em Pittsburgh, sua cidade natal. O pequeno Andrew já exibia talento artístico e levava consigo desenhos de estrelas e borboletas para vender aos clientes dos irmãos. Duas décadas depois, no fim dos anos 50, ele era um dos mais bem pagos ilustradores de revistas e de publicidade de Nova York, onde morava desde que se formou em artes comerciais.
A transição para a prática artística ocorreu naturalmente. Desde os anos 50, artistas ingleses como Richard Hamilton usavam a cultura americana como tema – em geral em tom de crítica ou paródia – em suas obras. Era o início da arte pop. Nos anos 60, ela chegaria com vigor aos Estados Unidos. Roy Lichtenstein se apropriou da linguagem dos gibis em suas pinturas. Jasper Johns levou às telas símbolos patrióticos, como a bandeira e o mapa americanos. Warhol seguiu o movimento, com a técnica de serigrafia que usava no mundo editorial e publicitário. Em sua primeira exposição individual, em 1962, retratou as latas de sopa Campbell’s. Ele havia passado a juventude almoçando o conteúdo dessas latas. Ali, mostrou um dos elementos que guiariam todo o seu trabalho: o uso (e abuso) da repetição. Ele expôs 32 desenhos das latas, cada uma mostrando um sabor diferente no rótulo. Para Warhol, a produção em série dos produtos industrializados era o que definia a sociedade como um conjunto uniforme. Cada pessoa se distinguia das outras a partir de suas escolhas na hora da compra. Assim, o desejo por um produto – no caso, a sopa – levava a um padrão de comportamento. E a preferência por um sabor diferenciava um indivíduo do outro. O impacto de sua obra lhe conferiu a alcunha de “o papa do pop”. A força de sua arte repousa em um paradoxo: ela faz uma crítica demolidora da sociedade de consumo e ao mesmo tempo a glorifica.
Ainda em 1962, na série em que reproduzia centenas de notas de dólar, Warhol rompeu com a tradição artística ao assumir de maneira provocadora sua paixão pelo dinheiro. Mestres do expressionismo abstrato como Jackson Pollock exibiam uma atititude de superioridade e esnobavam a riqueza. Warhol era diferente. Ele não tinha vergonha de vincular seus interesses financeiros ao trabalho. Queria realizar a cultura pop tanto em sua obra como na vida. Buscava obter lucro e realizar assim o sonho americano. Uma de suas frases famosas é: “Boa arte é bom negócio” (Good art is good business). O mercado de arte atual é muito mais próximo dessa visão do que a de Pollock. O interesse econômico dos artistas nunca mais foi dissociado do mundo das artes.

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